sexta-feira, 11 de junho de 2010

AMAR É PARA OS FORTES

Há que se ter o coração bem treinado
Para se amar alguém e,
Sem alarde nem lágrimas,
Vê-lo partir para nunca mais.
Treinar o coração para isso deve exigir
Décadas de esforço e labuta,
Uma vontade robusta,
Uma força leonina.
E nem sempre se consegue a contento.

Ver ir embora quem a gente ama,
Compreendendo que por definitivo
Não mais teremos a sua companhia,
Seu cheiro, sua melodia, sua textura, suas histórias,
E que “a vida é assim mesmo,
Que é que se há de fazer?!”,
Não é para qualquer um.
É para os que são de ferro.

Na maior parte das vezes o que fica é esse gosto
Meio amargo de que uma parte essencial
De nós se foi, partiu, se perdeu.
E o que por um bom tempo perdura
É esse nó na garganta,
Esse vazio nas mãos,
Esse abismo na alma.
E, Deus!, como dói!

De repente a gente se sente tão espremido por lembranças:
Pequenas coisas, sons, perfumes, lugares, cores, nomes, canções
Gritam uma presença que já não há, que já não temos.

Quisera eu não amar a mais ninguém de hoje em diante!
Ficar no meu canto e levar a vida
Sem precisar dos carinhos de quem quer que seja,
Não precisar que me segurem a mão
Nas noites de tempestade,
De ninguém para dizer que tudo ficará bem no final.
Como assim “bem no final”?!
Eu, que tenho sérios problemas com os finais,
Por medo ou deficiência, por falta de grandeza,
Que não vejo nenhuma dignidade nos fins, que direi?

Talvez, não sei, a melhor prova de amor a si mesmo
Seja não amar tão profundamente o outro,
Não ter apego a nada que seja vivo e que tenha vontade própria.
Assim amaríamos apenas os objetos, as coisas imperecíveis.

Às pessoas e aos animais,
A tudo o que morre, enfim,
Apenas nos limitaríamos a querer bem, a estimar, a ter apreço.
Mas não nos abandonaríamos no mundo alheio para o que desse e viesse,
Com planos e projetos duradouros,
Sofrendo com suas dores, chorando por suas angústias.
Estaríamos assim mais preparados para as despedidas? Quem sabe?
O que sei e sinto é que depois de tudo,
Depois de tudo ficam os fantasmas
A dizer que são efêmeras as alegrias,
A infernizar os sonhos e a realidade com lembranças.

E que são essas lembranças, agora tristes,
Senão a prova de que fomos felizes um dia, mas não mais hoje,
Não mais agora, não mais?
“Amar é sofrer”, dizem os sábios.
“O amor é para os fortes”, dizem os fracos.
Se o sofrimento traz alguma sabedoria, como dizem,
Que maldita equação devemos tirar desse estar só,
Dessa tristeza, dessa agonia?

Sofremos pelo vazio que permanece depois do adeus
Como ficamos escutando ecos de um grito
Tonitruante, estrepitoso, emitido há pouco,
Numa gruta.
E o que é a gruta senão a metáfora de um coração apertado?
Que é o grito senão a pessoa que se foi, o outro, em carne e osso,
Que ainda ontem beijamos, abraçamos e com quem fizemos amor,
E que hoje já não sabemos aonde e com quem está?
Que é o eco senão uma imagem que se repete,
Que se faz presente em milhares de situações diferentes,
Mas que a cada vez que aparece vai perdendo em cor e nitidez,
Que se enfraquece até a extinção das aparições recorrentes?
Claro, voltará vez ou outra, a imagem,
Mas não com tanta força como antes,
Porque “a vida segue adiante” e
Porque precisamos nós também seguir em frente.
O que fica depois do grito é o eco.
E o que fica depois do eco é
A sensação nítida de que houve ali um grito.
A diferença é que um grito não deixa marcas na caverna,
Enquanto que um amor ido deixa profundas inscrições
Em um coração que realmente amou,
Que se doou até o limite do irracional, que de fato quis bem,
Que cuidou e protegeu enquanto pôde.

Hoje eu só queria ter um coração de pedra,
Muralha impossível aos amores e às paixões.
Deixar-me ficar em meu canto, quieto, cuidando
Das coisas práticas e objetivas da existência.

Talvez isso signifique ser menos sábio, eu sei.
Não é um desejo inteligente de minha parte,
Mas significa sofrer menos também
(E já não há nisso alguma sapiência?!).
Talvez sim.
Amar devia implicar em não ser egoísta,
Agüentar de pé a partida do outro, a desistência do outro,
A escolha do outro,
Até mesmo o desejo do outro por outros,
Sem desmoronar,
Sem esmorecer,
Sem semblantes anoitecidos.

Por isso é que é coisa para os fortes.
Agüentar que o outro não mais nos quer, não mais nos precisa,
E ainda assim, tranquilamente, deixá-lo ir
Não é e nem será fácil para a maioria dos mortais.
Pensando assim, perguntamos: quando de fato amamos?
Ora, a partida do outro a mim sempre entristeceu.
Eu que desde pequenino, tenho
Escasso talento para as partidas e
Talento em excesso para a saudade, que faço?
Resta tentar aprender.
Senão agora, quando?


11 de junho de 2010

2 comentários:

  1. Amar é para todos. Chorar e sentir a perda, também. Acho que ser forte não implica em parecer incólume diante das dores, mas levantar depois da queda e seguir em frente, sem perder a sensibilidade. O medo da dor da perda é perigoso. Pode nos endurecer ou nos dessensibilizar. Ser duro e insensível é um recurso para lidar com perdas futuras sem tanto sofrimento, mas, como triste efeito colateral, pode reduzir nossa capacidade de amar e amar outras vezes.

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  2. Valeu a iniciativa do blog, mano De Cusa. Criar sempre, se expressar sempre, para não enlouquecer. E para se reconheSer, também. abração

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