quinta-feira, 27 de março de 2014

AOS QUE FAZEM DO PEQUENO PALCO UM VASTO MUNDO






Era uma vez eu
E os meus incompletos 14 anos.
Era uma vez eu
E uma vontade ensandecida de fazer teatro,
(fosse onde fosse,
Fosse com quem fosse,
A hora que fosse,
Desde que fosse).
Importava era estar ali
Com os meus pares,
Com os meus ímpares,
Na igrejinha,
No conselho de moradores,
Na rua,
Na escola e até,
Pasmesm!,
No teatro,
Se desse,
Se pudesse,
Se tivesse a chance).

Vieram os cursos (FUNDAJ, SESC, UFPE)
E os textos foram chegando
Caindo em meu colo
Aos borbotões.

Encantava-me pelos nomes sonoros e cheios de mistérios
(Menandro, Eurípedes, Genet, Pirandello,
Shakespeare …  O'Neill... Rodrigues
Grotowski, Artaud, Antunes, Mnouchkine
Barba, Brecht, Beckett, Brook, Boal)

Ia dormir tardão da noite lendo
(Minha mãe achava que eu ia mesmo perder o juízo,
Enlouquecer – na verdade ainda acha)
E à medida que
Ia descobrindo mundos
Mais queria saber
Sentia o vazio da ignorância como uma afronta.

Minhas limitações como ser humano,
Minhas falhas como pessoa
E o difícil oficio que é ser gente.
Putz, como doía, roia, machucava!

E quantas e tantas vezes a gente se sente sozinho,
Pequeno, miúdo, espremido, inseguro,
Na coxia,
Prestes e entrar em cena,
Pouco antes de acenderem as luzes e tudo começar
De novo e mais uma vez?!

O coração aos pulos, o suor escorrendo,
O baita frio na barriga,
Mas certo,
Convicto,
De aquilo mesmo tinha de ser feito
E bem feito, o melhor que o time pudesse!

É verdade
Nem sempre fiz espetáculos de que me orgulhe
Nem sempre foi prazeroso
Mas valeu à pena sempre
Por que sempre a gente descobre
Que mesmo na mais difícil empreitada
Há alguém lá que faz valer à pena.

E já lá se vão 26 anos!
Evoé!

(Aos meus mais caros amigos das horas difíceis
Aos meus mais chegados colegas das horas leves
A todos os conhecidos,
A todos os desconhecidos,
Às camareiras, costureiras,
Aderecistas, porteiros, bilheteiros,
Cenotécnicos, dramaturgos, dramaturgistas,
Preparadores de elenco,
Iluminadores, contra-regras,
E todos os artistas que ocupam o palco
A rua, o estrado, o picadeiro,
Enfim, aos que heroicamente
Fazem e acreditam no teatro deste país
(com ou sem patrocínio público)
Todos os que dão o seu sangue, a sua alma e o seu suor
Para corporificar em cena uma idéia, um sonho, uma denúncia...
A todos os que labutam, ralam, se esfalfam na cena
E dela tiram o sustento de cada jornada,
Sem cessar jamais de acreditar que é possível,
Mesmo tirando de onde não têm,
Apostando no que ainda não pode ser visto,
A vocês,
Os meus mais sinceros
Mais verdadeiros
agradecimentos
E votos de
Muito
Muito
Muito
Sucesso
Na vida)

domingo, 2 de março de 2014

Che Cos`é la Poesia, DERRIDA?

"Para Jacques Derrida (…), o poema vem sempre do outro, é um ditado do outro, que eu desejo aprender de cor, isto é, através do coração que memoriza um texto que se define pela concisão e a economia das palavras. Há um percurso do poema (e a poesia não existe, só existem poemas), que vai desde o cais de partida ao porto de chegada, deixando que se inscreva no texto a marca da origem e as vicissitudes do percurso (desfiguração, transfiguração, indeterminação), e tendo sempre no horizonte a potencial relação com um referente: «Come, bebe, engole a minha letra, porta-a, transporta-a em ti como lei de uma escrita em que o teu corpo se tornou: a escrita em si». Que esta escrita em si tenha a ver com a configuração linguística do poema de que fala Adorno, eis o que me parece bastante óbvio. Mas o que em Derrida se reforça é a energia do «tu» e a paixão do singular: «Chamarás poema a uma encantação silenciosa, à ferida áfona que de ti desejo aprender de cor.»

Eduardo Prado Coelho, «Esse Pássaro Fluido»

IMPORTANTE: ver na Estante Virtual a revista INIMIGO RUMOR n.º 10 com o texto completo de Derrida.
"Ler, escrever, não duvidamos que tais palavras sejam solicitadas a ter, em nosso espírito, um papel muito diferente daquele que ainda tinham no começo do século XX: isso é evidente, qualquer rádio, qualquer tela, nos advertem disso e, mais ainda esse rumor em volta de nós, esse zumbido anônimo e contínuo em nós, essa maravilhosa fala inesperada, ágil, incansável, que nos dota a cada momento de um saber instantâneo, universal, e faz de nós a mera passagem de um movimento em que cada um é sempre, de antemão, trocado por todos. "
Blanchot, O livro por vir