terça-feira, 25 de junho de 2013
A ÂNSIA DE DESTRUIÇÃO
“Fala-se muito da ânsia de destruição da massa; é a primeira coisa nela que nos salta aos olhos, e é inegável que se trata de algo encontrável em toda parte, nos mais diferentes países e culturas. Em bora se constate e desaprove tal ânsia, ela jamais é realmente explicada.
“A massa destrói preferencialmente edifícios e objetos. Como frequentemente se trata de coisas quebradiças – como vidraças, espelhos, vasos, quadros, louça -, inclinamo-nos a acreditar que é justamente esse caráter quebradiço dos objetos que estimula a massa à destruição. Seguramente o ruído da destruição – o espatifa-se da louça, o tinir das vidraças – contribui de modo considerável para o prazer que se tem nela: são os vigorosos sons vitais de uma nova criatura, os gritos de um recém-nascido. O fato de ser tão fácil provoca-los intensifica-lhes a popularidade: todos gritam em uníssono, e o tinir é o aplauso dos objetos. (...) Seria, porém, equivocado acreditar que o decisivo aí é a facilidade com que as coisas se espatifam. Homens lançaram-se sobre esculturas de pedra dura, não descansando até vê-las despedaçadas e irreconhecíveis. Cristãos destruíram as cabeças e os braços de deuses gregos. Reformadores e revolucionários puseram abaixo as imagens dos santos, por vezes derrubando-as de alturas que punham em risco a sua vida, e, amiúde, tão dura era a pedra que buscavam destroçar que somente em parte logravam fazê-lo.
“A destruição de imagens representando algo é a destruição de uma hierarquia que não se reconhece mais. Violam-se as distâncias universalmente estabelecidas, visíveis a todos e vigentes em toda parte. A dureza da imagem era a expressão de sua durabilidade; elas existem há muito tempo – pensa-se -, existem desde sempre, eretas e inamovíveis; e era impossível aproximar-se delas munido de um propósito hostil. Agora, foram derrubadas e reduzidas a escombros. Nesse ato consumou-se a descarga.”
Elias Canetti em “Massa e Poder”
“O mais impressionante de todos os meios da destruição é o fogo. Ele é visível de longe e atari mais pessoas. Além disso, destrói de modo irrevogável. Depois de um inc|êndio, nada permanece como era. Ateando fogo às coisas, a massa julga-se invencível. À medida que o fogo se propaga, tudo se junta a ela. Ele aniquila tudo o que lhe é hostil. Como se verá, o fogo é o símbolo mais vigoroso que existe para a massa. E, terminada a destruição, o fogo, assim como a massa, tem de extinguir-se.”
Elias Canetti em “Massa e Poder”
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário