segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

“A Batalha do Chile”




Resenha de Alexandre Madruga para
Estética e Cultura de Massa II, professor Ivan Capeller


O cineasta documentarista chileno Patrício Guzmán produz nesse documentário histórico, feito após seis anos de trabalho, mais de cinco horas de filmagem, subdivididas em três partes, no qual mostra o crescimento e a queda de Salvador Allende.
A primeira parte da filmagem, "A Insurreição da Burguesia" (1975), relata a reação da direita contra a tentativa o socialismo democrático no país que tentava ser implementado, com greves por sindicatos e o boicote econômico, que teve influência do governo dos EUA.
"O Golpe de Estado" (1977), que é a segunda parte do documentário, fixa o foco na guerra civil que levou ao bombardeio do Palácio de La Moneda e à morte do presidente em 11 de setembro de 1973, sob a liderança de uma junta militar encabeçada por Pinochet.
"O Poder Popular" (1979) finaliza a filmagem, revelando algumas ações coletivas realizadas por populares com intuito de acabar com a crise durante o governo Allende, como armazéns comunitários e comitês camponeses, que serviam de sustento para alimentação de parte da população.

“Batalha” foi considerado um dos melhores documentários políticos da história, relatando a primeira transição democrática ao socialismo da história da América Latina

Para a crítica norte-americana Pauline Kael, "como uma
equipe de cinco pessoas, algumas delas sem nenhuma
experiência prévia, conseguiu produzir uma obra dessa
magnitude?" O documentarista João Moreira Salles,
responde que "ao longo daqueles anos, a história estava
em marcha e havia alguém com a férrea disposição de
não desligar a câmera." Esse desejo de levar o cinema às
últimas conseqüências fica evidente na cena mais famosa
do filme, em que um cinegrafista baleado pela polícia
filma a própria morte.(1)


O documentário mostra um país em extrema tensão, uma população rachada ao meio entre esquerda e direita, numa realidade caótica de greves, passeatas, manobras políticas, que finalizam com um golpe militar e a morte (assassinato) do Presidente Allende.
A criação do documentário ganha ares épicos, por toda sua trajetória percorrida pelos cinco integrantes da equipe de filmagem, até a chegada das latas de negativo (de forma clandestina) por navio para Cuba, onde o Guzmán montou o filme com a ajuda do Instituto del Arte y la Industria Cinematográficos (Icaic). A “via crucis” de Guzmán após as filmagens foi grande, pois logo depois da conclusão do trabalho, foi preso em casa, levado ao Estádio Nacional e ameaçado de fuzilamento, no entanto acabou posto em liberdade. Já o cinegrafista Jorge Muller Silva desapareceu de vez, depois de ser seqüestrado pela polícia militar.
A produção teve o claro intuito de demonstrar como ocorreu todo o processo, apresentando as prévias dos acontecimentos, como eram arquitetados e por quem, mostrando todos os lados da questão de maneira exaustiva, deixando claro ao espectador a real situação chilena da época. A locução em off deixa o espectador ciente e consciente dos acontecimentos, permitindo toda e necessária compreensão do golpe. Filmou desde assembléias de fábricas, passando por trabalhadores do campo, moradores de bairros construindo um abastecimento alternativo, até militantes de direita. Guzmán registra e analisa toda a caminhada chilena
pela via democrática ao socialismo, abordando temas difíceis como as nacionalizações, o apoio ambíguo da presidência ao processo de construção do "poder popular" que se dava com as ocupações, além da participação direta através de assembléias locais e regionais, e as contradições entre este poder popular e um Estado que acabou paralisado pelo Congresso e as ações de sabotagem apoiadas pela CIA e pelas elites.

Para João Moreira Salles, “O resultado é um filme
inegavelmente belo, decididamente épico e certamente
trágico. (...) Guzmán filmou tudo, até o último momento.”
O jornal espanhol Cambio 16 escreveu: "A Batalha do
Chile é o filme mais impressionante exibido em Cannes
este ano". Na França, o Le Monde acompanhou: "É a
primeira obra de arte a encarnar uma nova forma de
analisar a história." O Los Angeles Times concordou:
"Um documentário admirável sobre um país que é lançado
no caos com a inevitabilidade de uma tragédia grega".(2)


Apesar da eleição de Allende, da esquerda chilena, é curioso perceber que a maior parte da grande mídia era controlada pela oposição de direita. A mais perigosa era a emissora de TV, Canal 13, com grande audiência popular e com fortes interesses conservadores que Guzmán usava um crachá falso da emissora para entrevistar esse público.Graças a essa iniciativa, conseguiu passar para o documentário o clima de revolta da classe média e da burguesia em relação às medidas populares do governo Allende. Esse é apenas alguns aspectos do belíssimo documentário. Trata-se de uma obra obrigatória para estudantes discentes em geral e comunicadores.


1.       Revista Núcleo Piratininga de Comunicação, Edições 094, Fevereiro de 2006
2.       Depoimentos ao Portal midiaindependente.org - Dissertação baseada nos capítulos apresentados no Auditório Hanns Donner da UniSuam / Bonsucesso e nos extras do Box “Batalha do Chile” em “Patricio Guzmán: uma história chilena” (2001); “A resistência final de Salvador Allende” (1988), “Entrevista de José Carlos Avellar com Patrício Guzmán” (2005), além da “Filmografia do diretor”.


http://alexandremadruga.files.wordpress.com/2011/08/a-batalha-do-chile-resenha.pdf

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