Não somos somente um nome e nem é só o nome o que nos
singulariza. Há milhares de Marias, Terezas, Renatas, Anas, Carlos, Paulos,
Josés, Joões, Manoéis, Pedros... Tantos com prenomes e sobrenomes completamente
idênticos. Nascidos alguns nas mesmas datas, até. O que nos singulariza, mesmo
que houvesse a hipótese de não termos um nome, para o bem e para o mal, somos
nós mesmos: nossa cara, nosso corpo, nosso jeito, gesto, pensamentos, desejos,
crenças, atitudes, formas de olhar, de caminhar, de encarar o mundo, de amar,
de odiar, de se indignar, de se submeter a certas circunstâncias, nossa ética,
estética, tribo, ofício, escolhas, histórias. Também nossas quedas, feridas,
vazios, dores, encontros, desencontros, perdas, solidões. A esta pessoa que é cada um de nós,
induplicável, indivisível, uno, deram (dão, darão) previamente, no começo da
estrada, no início da jornada ainda, na chegada, um nome. Ou seja: um nome,
antes de toda a história, de todo gesto, de tudo, enfim, é um título e uma
aposta... no futuro, no presente, à cegas, nominada e singular.
domingo, 18 de setembro de 2016
Senta-se ele à mesa, na sala semiescura. E se se vê frente a
frente com a brancura do papel.
Esculpir ali no vazio da página, em contraste, com tinta
preta, uma a uma, as palavras que marcarão a escultura, a paisagem em desenho
fértil do que ainda não há.
De dentro para fora, em claro e escuro, cava nichos,
protuberâncias, figuras.
Crava, perfura, lima, rasga, risca, corta, em grossas camadas,
as superfícies planas do papel.
Cria as reentrâncias, relevos, saliências, silêncios e sons.
Trabalha, enxerta, extrai, substitui, permuta, até que ganhe
tridimensionalidade as imagens invisíveis e cifradas, até que, mãos leves e
alma nua, a invisível efemeridade que somos, transparece e ganha vida e vira
música.
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