Então...
Quando me apaixonei pela primeira vez, não sabia o que era paixão. Só sentia uma saudade medonha quando ela não estava por perto. Ficava desenhando mentalmente as feições de Leninha, mas sem conseguir traçar bem as curvas, as cores, as reentrâncias, o perfume, o jeito moleca.
Quando me apaixonei pela primeira vez, não sabia o que era paixão. Só sentia uma saudade medonha quando ela não estava por perto. Ficava desenhando mentalmente as feições de Leninha, mas sem conseguir traçar bem as curvas, as cores, as reentrâncias, o perfume, o jeito moleca.
Um
dia a segui, sem que me percebesse, até a sua casa, que ficava próxima a
padaria do bairro. Dai em diante, fins de tarde, queria ir sempre comprar pão.
Minha mãe estranhou aquilo, aquela disponibilidade surpreendente para descer a rua, quando sempre me negava a ir. Passei a pentear mais o
cabelo, a botar perfume, a não ir tão desarrumado. Queria passar na frente da sua
morada, e havia um trecho do caminho em que andava em câmera lenta, para ver se
ela me via, para ver se eu conseguia vê-la. Uma vez a encontrei lavando louças
no quintal num vestidinho-inho-inho de chita, colorida e cheia de espuma nas
mãos. Linda, me viu, parou um momento o que estava fazendo e me sorriu.
Assim, a partir desse instante breve (que durou
muito para soverter-se em minha imaginação), sempre que estava distante dela
redesenhava seus contornos, as suas curvas, as suas formas, mentalmente. E quando se
presentificava, quando de repente estava frente a frente com ela, sentia o
terremoto tomando corpo: frio na barriga (ou seriam borboletas?), tremores nas
mãos, um nó na garganta, gagueira súbita e um formigamento intenso nas pernas. Era
um cataclismo. E foi assim, desequilibradamente, que descobri o que era estar
apaixonado.
Anos depois, quando comecei a fazer de teatro,
perto da minha primeiríssima estreia, na velha capela de São José, no Córrego
do Jenipapo (Casa Amarela), sabendo que em poucos minutos entraria em cena para
fazer algo que só eu poderia fazer, com a minha voz, meu suor, meu corpo, minha
vida, meu afeto, fiz outra nova descoberta (para mim) fantástica: é que outra
vez me vieram os tremores, outra vez o frio (borboletas?) na barriga, outra vez
o formigamento e uma vontade insana de fazer xixi. Era algo tão poderoso quanto
encontrar Leninha, era desestabilizador. E demorava um ou dois segundos para sentir o mundo
aquecer, depois que entrava em cena. É assim ainda, quando retorno aos palcos
(agora mais dirigindo as encenações do que trabalhando nelas como ator), todos
os sintomas, surpreendentemente, me retornam, fixam-se em mim, me
desestabilizam.
Agora neste início de agosto são vocês, meus
amores, meus colegas, meus amigos, do Curso de Interpretação para Teatro (SESC
Santo Amaro), que estarão entrando em cena para uma aventura intensa e cheia de
paixão com a Leninha de vocês.
Eu, ali sentado na platéia, no escuro, vou
torcer por cada instante. E vou pedir aos deuses todos que os iluminem com luz,
sucesso e aprendizado renovado em cada novo projeto que vocês se meterem. Vai
ser bom! Vai ser foda!
Uma vez, numa de nossas primeiras aulas, falei
sobre a grande diferença entre SER APAIXONADO e SER APAIXONANTE. Que uma pessoa
com paixão é coisa boa, mas que uma que seja capaz de incendiar os outros com a
sua paixão é supremo. Que possamos incendiar com a nossa paixão os que entrarem
em contato conosco. Que seja combustão pura. Que seja luz e calor. Agora,
estrelas, é chegada a hora de brilhar. Vão lá e arrasem!
Saudades de vocês, saudades de todos, saudades
de tudo.